domingo, 2 de abril de 2017

A aplicação prática do princípio da proporcionalidade


A nossa Constituição (CRP) apresenta vários princípios que estabelecem formas de regular a atuação da Administração Pública, concretizando-se também no Código do Procedimento Administrativo (CPA). O princípio da proporcionalidade é justamente um deles, enunciado no art.266º/2 CRP e no art.7º do CPA, e classificado pelo professor Freitas do Amaral como “o princípio segundo o qual a limitação de bens ou interesses privados por atos dos poderes públicos deve ser adequada e necessária aos fins concretos que tais atos prosseguem, bem como tolerável quando confrontada com aqueles fins.”[1], e que o Professor Vasco Pereira da Silva resume como o princípio que “permite controlar o próprio modo como o poder discricionário é exercido”.

Embora com algumas diferenças relativamente à denominação atribuída, é consensual entre os vários autores reconhecer três requisitos quanto ao princípio da proporcionalidade: adequação; necessidade; equilíbrio ou razoabilidade (Marcelo Rebelo de Sousa)[2]. Começando por analisar o primeiro requisito diz o professor Freitas do Amaral: “a medida tomada deve ser casualmente ajustada ao fim que se propõe atingir (cfr. CPA, artigo 7º, n.º1)”[3]; e quanto aos outros dois requisitos diz Marcelo Rebelo de Sousa: “A necessidade proíbe a adopção de condutas administrativas que não sejam indispensáveis para a prossecução do fim que concretamente visam atingir (impondo, portanto que, de entre diversos meios igualmente adequados, seja escolhido o menos lesivo para os interesses públicos e/ ou privados envolvidos).”[4] e que “A razoabilidade proíbe que os custos da actuação administrativa escolhida como meio de prosseguir um determinado fim sejam manifestamente superiores aos benefícios que sejam de esperar da utilização.”[5] Com efeito, e tendo em conta que estes 3 requisitos apresentados são cumulativos, basta que um deles não se verifique para estar em causa uma atuação desproporcional, e poderá dar-se o caso de uma sobreposição de interesses.

Este dever da Administração atuar segundo um princípio de proporcionalidade, é muitas vezes violado e um dos muitos exemplos que chegam a Tribunal é o caso do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), de 7 de Abril de 2016 em que é Recorrente o Município de Santa Cruz, inconformado com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal (TAFF) e que diz respeito à exigência de demolição de um edifício por diversas irregularidades cometidas durante o processo de licenciamento. Durante a leitura do Acórdão, embora este princípio constitucional não seja diretamente enunciado muitas vezes, encontra-se referência por diversas vezes, por exemplo quando se lê: “''princípio da menor demolição'' – está aqui presente a ideia de “não prejuízo excessivo” que o professor Vasco Pereira da Silva considera com uma das “três dimensões do princípio da proporcionalidade” e que obriga a Administração a tomar uma decisão que cause o menor dano possível.

Nas conclusões sumárias apresentadas pelo TCAS pode ler-se: “ (…) ii) A demolição só deve ser ordenada se não for possível a legalização, com ou sem a realização de trabalhos de correcção ou de alteração. iii) Tal regra é um afloramento do princípio constitucional da proporcionalidade (art. 18º, nº 2 da CRP) que impõe que não sejam infligidos sacrifícios aos cidadãos quando não existam razões de interesse público que os possam justificar. iv) Assim, se as obras, apesar de ilegalmente efectuadas, podem vir a satisfazer os requisitos legais e regulamentares de urbanização, não devem, sem mais, ser demolidas.” Também aqui o TCAS invoca ainda que indiretamente os pressupostos referidos supra, relativos ao princípio da proporcionalidade, e que se prendem com o facto de apenas se ordenar demolição se efetivamente não houverem outros meios de suprir as ilegalidades cometidas. Em conformidade com isto, o TCAS decidiu então: “ (…) Conceder parcial provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida na parte que ordena a demolição do edificado; e, em substituição (…) Condenar o Município de Santa Cruz a apreciar da susceptibilidade de legalização do edificado (…) sob pena da sua demolição”.

Em suma, para que a Administração tome decisões que não acabem por violar o princípio da proporcionalidade, de forma muito sucinta, deve agir de forma adequada, necessária e razoável para não sacrificar injustificadamente os particulares e vir a ter problemas de legalidade, que foi precisamente o que aconteceu no caso referido supra.

Bibliografia:
·         Amaral, Diogo Freitas doCurso de Direito Administrativo, Vol.II. Coimbra: Almedina. (2016.)
·         Matos, andré salgado de e sousa, marcelo rebelo de. Direito Administrativo Geral – Introdução e princípios fundamentais, Tomo I. Lisboa: D.Quixote. (2016).
·         Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 07/04/2016 (Pedro Marchão Marques) Disponível em: http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/03401b0313d6737c80257f9c0036251b?OpenDocument (Consultado em 31/03/2017)


[1] Amaral, Diogo Freitas do. Curso de Direito Administrativo, Vol.II, p.113
[2]matos, andré salgado de. e sousa, marcelo rebelo de. Direito Administrativo Geral, tomo.I, p.214
[3] Amaral, Diogo Freitas do. Curso de Direito Administrativo, Vol.II, p.113
[4] matos, andré salgado de. e sousa, marcelo rebelo de. Direito Administrativo Geral, tomo.I, p.214
[5] Ibidem p.214

Filipa Esteves Dias
Nº28542

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