Evolução Histórica da Administração Pública
Estado Liberal e
Administração agressiva
O
Estado liberal, que teve o seu auge no fim do século XVIII, inícios do século
XIX, corresponde a um modelo de administração agressiva e limitada.
Nem
todos os Estados liberais adoptaram este modelo de administração. Todavia é um
modelo que estará associado ao Estado Liberal e que corresponde à sua
caracterização, uma vez que este tipo de Estado entende a administração como
uma realidade agressiva. Esta denominação de “agressiva” provém do alemão Bauer
Münster.
Esta
administração agressiva decorre do facto de os liberais não simpatizarem com a
administração pública.
Os
liberais queriam limitar a administração pública através do princípio da
legalidade, contudo, em matérias que a lei não regulasse a administração tinha
liberdade para atuar da forma que quisesse, podendo exercer a força física, uma
vez que a administração existia para o domínio da polícia e das forças armadas.
De acordo com o ponto de vista liberal tudo o resto não era tarefa
administrativa.
O
princípio da legalidade tem duas dimensões: a dimensão positiva e a negativa.
Na primeira, a administração apenas pode fazer aquilo que a lei expressamente
lhe permite. Na dimensão negativa a administração pode fazer tudo o que a lei
não proíbe.
À
administração agressiva corresponde a dimensão positiva do princípio da
legalidade.
Predominava
a ideia de uma administração que, ao garantir a segurança, agredia a esfera do
particular - os seus direitos. A administração impunha aos cidadãos determinada
conduta e era coerciva.
A
administração em causa tinha como principal meio de atuação o ato
administrativo. Este era entendido como manifestação autoritária de poder
estadual relativamente a um particular determinado.
O
ato executório deste tipo de administração era o primado da força. O professor
Marcello Caetano defendia que o ato era, por um lado definitivo, ou seja, era a
última palavra jurídica da administração perante os particulares; por outro,
era executório, por outras palavras, era suscetível de execução coativa contra
a vontade dos particulares. A administração podia executar este ato e este
primado da força. A administração só tem poderes de execução quando,
expressamente, a lei lhe atribui esses poderes.
Do
ponto de vista da organização administrativa era o Estado que administrava,
praticamente, tudo. Começam a surgir as autarquias mas, inicialmente, como
entidades dependentes do Estado. Por outro lado, era uma lógica de
administração concentrada – herança do anterior tipo de Estado: Estado
Absoluto. O Governo era o órgão que decidia sobre tudo, no quadro do Direito
Administrativo.
O
Professor Doutor Vasco Pereira da Silva considera que o que caracteriza o
Estado liberal é a primazia do ato administrativo e do ato unilateral.
Neste
período, surgiram os direitos individuais, liberdades e garantias face ao
Estado.
A realidade do Estado liberal vai ser posta em
causa na transição do Estado liberal para o Estado social.
O Estado Social e
Administração Prestadora
O
Estado Social instaurou-se nos finais do século XIX, inícios do século XX.
Posteriormente,
à II Guerra Mundial este tipo de Estado foi implementado em muitos países,
principalmente na Europa.
O Estado tinha uma função de intervenção no mercado, sendo essa a sua tarefa
fundamental.
Ao
Estado Social está associada a administração prestadora: a administração que
presta bens e serviços; que concede benefícios aos particulares.
A
função primordial do Estado Social era a função administrativa. Era através da
administração pública que o Estado realizava as suas tarefas da vida económica,
cultural e social. Neste sentido, Ernest Forsthoff, caracteriza o Estado Social
como sendo um Estado de administração, pois é a administração que o caracteriza.
Esta
administração tem múltiplos meios de atuação privilegiados, enquanto a forma de atuação da administração agressiva era o ato, esta administração tem a
liberdade de escolher se quer praticar um ato unilateral, um contrato ou se
quer atuar através do direito privado. É a administração que escolhe a melhor
forma de satisfação das necessidades coletivas. A administração tem aqui uma
discricionariedade no quadro da sua atuação. Estamos perante uma grande mudança
introduzida pelo Estado Social.
O
ato da administração prestadora, que atribui bens e serviços aos particulares,
que cria vantagens, não possui as qualidades do ato autoritário. Em primeiro
lugar não era, nem um ato definitivo, nem um ato definidor de direito, isto é,
a Administração não diz o direito, a administração apenas utiliza o Direito
para satisfazer as necessidades coletivas.
Há
uma desconcentração ao nível do Estado, este tem órgãos de poder divididos
pelos diferentes locais, que manifestam uma vontade que é imputável ao Estado. Existe
uma multiplicidade de pessoas coletivas que exercem em simultâneo a função
administrativa. Estamos perante uma descentralização da administração.
Este
modelo de Estado Social e de administração prestadora corresponde ao segundo período
de evolução do contencioso administrativo. Período esse que o Professor Doutor
Vasco Pereira da Silva denomina de “baptismo do contencioso administrativo” ou
período da jurisdicionalização da justiça administrativa. Esta é ainda
limitada, uma vez que neste período o âmbito de jurisdição dos tribunais é
limitado. No início do século XX, em alguns países europeus, os órgãos cuja
função era julgar a administração, tornaram-se verdadeiros tribunais.
Este
período introduz uma nova realidade, nomeadamente, a aproximação dos sistemas
de administração. No Reino Unido, os tribunais comuns julgavam a administração
e não existia Direito Administrativo, situação que viria a ser alterada com
esta realidade.
Com
o Estado social surge um Direito próprio para a administração. Isto porque é
preciso regular a atuação do Estado, nomeadamente, no domínio da economia.
O
Estado social implementou os direitos que implicavam a atuação do Estado para
satisfazer as necessidades coletivas.
A
este tipo de administração corresponde o princípio da legalidade em sentido negativo.
Estado Pós-Social e a
Administração Prospetiva ou de Infraestruturas
O
Estado pós-social surge nos anos 70 do século XX.
Com
o Estado Pós- Social surge um novo modelo de administração: a infraestrutural.
Esta cria infraestruturas para que a Administração Pública e os particulares
realizem a função administrativa com mecanismos de cooperação, para além dos
autoritários que, continuam a existir. A administração não é exclusiva das
entidades públicas, é realizada em colaboração com entre a administração
pública e os particulares. É neste sentido que o Estado se torna regulador,
isto é, em vez de ser ele próprio a prestar os bens e serviços, cria
infraestruturas; legisla o modo de atuação de um determinado aspeto da função
administrativa e, posteriormente, controla o modo como os particulares estão a
agir.
No
que respeita a formas de atuação administrativa existem, também muitas
alterações. As atuações administrativas tornaram-se, maioritariamente,
multilaterais. A administração, em vez de praticar atos concretos e
individuais, praticava atos genéricos, que têm uma multiplicidade de destinatários.
No
quadro da organização administrativa, também o Estado Pós-social, introduziu
alterações: passaram a existir as entidades administrativas sob forma privada.
O
Estado pós social trouxe consigo um novo grupo de direitos procedimentais e
processuais.
Este
tipo de Estado corresponde a uma fase de evolução do contencioso
administrativo, que o Professor Doutor Vasco Pereira da Silva caracteriza como
o “crisma” ou a confirmação do contencioso administrativo.
Bibliografia:
"Em Busca do Ato Administrativo Perdido" - Vasco Pereira da Silva
"Curso de Direito Administrativo - vol. I - Diogo Freitas do Amaral
"Direito Administrativo Geral - Introdução e princípios fundamentais - Tomo I - Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos
Madalena Rosado
nº 28141
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