segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Evolução do Sistema Administrativo


     O sistema administrativo atual, enquanto conjunto de modos jurídicos de organização, funcionamento e controlo da Administração, baseia-se nos princípios da separação de poderes e da garantia dos direitos, ainda que a sua manifestação prática seja dissemelhante consoante a geografia.
A evolução deste sistema ficou a dever-se às revoluções liberais que incendiaram a Europa durante os séculos XVII e XVIII e que se propagaram até ao século XIX, pondo um ponto final ao absolutismo que vigorava há já vários séculos. Durante o período que antecedeu estas revoluções, o sistema administrativo da monarquia tradicional europeia caraterizava-se sobretudo pela ausência dos princípios suprarreferidos.
No que toca à separação de poderes, tanto as funções administrativa e jurisdicional como os órgãos que delas faziam parte eram praticamente indiferenciados; quanto ao Estado de Direito, a inexistência do princípio da legalidade (ou seja, a submissão da Administração à lei) refletia-se na insuficiência do sistema de garantias dos particulares face à Administração. Ou seja, além de se verificar frequentemente a acumulação de funções e jurisdições diferenciadas num mesmo órgão ou indivíduo, era ainda comum a não existência de normas regulamentares da Administração e a falta de vinculatividade das normas existentes face ao poder soberano.
A partir das revoluções liberais, o panorama altera-se completamente: por um lado, o poder do rei é dividido em funções diferenciadas e distribuído por vários órgãos, consagrando, deste modo, o princípio da separação de poderes; por outro, a Administração Pública passa a estar subordinada a verdadeiras normas jurídicas, passíveis de serem invocadas pelos particulares em defesa dos direitos e interesses que por esta sejam ofendidos, na medida em que é também neste período que se proclama a superioridade dos direitos humanos em relação ao poder político do Estado. Caraterísticas essenciais dos sistemas administrativos modernos, estas são também os pontos em comum entre o sistema de administração judiciária britânico e o sistema de administração executiva francês na medida em que, quanto ao resto, cada um dos sistemas dispõe de traços que os distinguem nitidamente, nomeadamente:
·         Quanto à organização administrativa, o sistema britânico é descentralizado (os atos administrativos são imputados a várias pessoas coletivas) e o sistema francês é centralizado (há uma única pessoa coletiva a quem são imputados os atos administrativos);
·         Quanto ao controlo jurisdicional da Administração, no primeiro caso há uma unidade de jurisdição (o controlo é entregue aos tribunais comuns), no segundo, há dualidade de jurisdição (são os tribunais administrativos que fazem esse controlo);
·         Quanto ao ramo do direito que regula a Administração, no sistema de administração judiciária é o direito comum (que é fundamentalmente direito privado); no sistema de administração executiva é o direito administrativo (ramo de direito público);
·         No que toca à execução das decisões administrativas, no sistema britânico, a Administração Pública não pode executar as decisões por autoridade própria, estando por isso dependente de sentença do tribunal; já no sistema francês, o direito administrativo confere à Administração Pública o privilégio da execução prévia que lhe permite executar as suas decisões por autoridade própria;
·         Quanto às garantias jurídicas dos particulares, a Inglaterra confere aos tribunais comuns plena jurisdição face à Administração Pública enquanto que em França, as garantias jurídicas contra os abusos e ilegalidades da Administração são efetivadas através dos tribunais administrativos que não gozam de plena jurisdição face à Administração;

Atualmente, é possível verificar-se uma aproximação dos dois sistemas relativamente a alguns dos pontos suprarreferidos, entre os quais evidenciamos, a título de exemplo, o aumento do intervencionismo britânico proveniente da passagem ao Estado Social de Direito e o consequente aparecimento de leis administrativas e a “fuga” para o direito privado da Administração do sistema francês em diversos domínios ou a adoção da instituição que em Portugal conhecemos como Provedor de Justiça, no campo da proteção dos particulares face à Administração Pública por ambos os sistemas. 


Carolina Miguel Pedro Ferreira
28227


Bibliografia utilizada:

FREITAS DO AMARAL, Diogo; Curso de Direito Administrativo, volume I, 4ª edição, Almedina, 2015
CAETANO, Marcello; Manual de Direito Administrativo, volume I, 10ª edição, Lisboa

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