segunda-feira, 22 de maio de 2017

O Princípio da Imparcialidade


          Segundo o professor Freitas do Amaral, a origem desta noção de imparcialidade vem do Direito Processual e da prática dos Tribunais. Começou por se exigir a imparcialidade do juiz (que tinha que ter uma posição super partes, não tomando partido de nenhuma dos lados em contenda). Este princípio (art.9º do Código do Procedimento Administrativo- doravante CPA e art. 266º, nº 2 da Constituição da Republica Portuguesa [CRP] ) foi, segundo o professor Marcelo Rebelo de Sousa, durante muito tempo entendido apenas como uma imposição de tratamento isento dos particulares pela administração, no sentido de que esta não os poderia favorecer ou desfavorecer por razoes ligadas aos titulares dos órgãos ou dos agentes administrativos que estão em concreto na posição de decidir e atuar. Modernamente, a imparcialidade deve ser entendida mais amplamente como tomada em consideração, por parte da administração, dos interesses públicos e privados relevantes para cada caso concreto.
         Este princípio tem uma dimensão negativa e uma dimensão positiva, na opinião do professor Freitas do Amaral. A dimensão negativa proíbe a administração de, a propósito de um caso concreto, tomar em consideração e ponderar interesses públicos ou privados que, à luz do fim legal a prosseguir, sejam irrelevantes para a decisão. A dimensão positiva impõem que, previamente à decisão de um caso concreto, a administração tome em consideração e pondere todos os interesses públicos e privados que, à luz do fim legal e prosseguir, sejam relevantes para a decisão. Da combinação das duas dimensões resulta portanto de que a Administração Pública “deve tratar de forma imparcial aqueles que com ela entrem em relação, designadamente, considerando com objectividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto decisório e adotando as soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção” (art 9º do CPA).
          A ordem jurídica assegura mecanismos tedentes a assegurar que os titulares de órgãos e agentes administrativos não influenciarão as decisões tomadas em procedimentos nos quais seria especialmente de recear que se comportassem de modo imparcial. Estes mecanismos são as garantias preventivas de imparcialidade. As garantias de imparcialidade implicam o impedimento dos titulares de órgãos e agentes quanto à participação em determinados procedimentos administrativos (o art.69º do CPA refere-se a situações de grande proximidade entre o titular de órgãos ou agente e os interesses privados em jogo no procedimento; já o art. 73º do mesmo código, numa escala menor de gravidade, diz respeito a situações que, apesar de poderem suscitar duvidas acerca da isenção do concreto titular de órgão ou agente administrativo, a sua proximidade em relação aos interesses privados em jogo no procedimento é menor) e na formulação das respectivas decisões. Em razão da diferente intensidade do perigo de violação do princípio da imparcialidade em cada um dos grupos de situações é também parcialmente diferente o regime jurídico dos impedimentos a que dão origem. Assim, as situações do art. 69º do CPA envolvem o impedimento absoluto do titular de órgão ou agente administrativo. O carácter absoluto do impedimento significa desde logo, três coisas: primeira, o impedimento não carece de qualquer declaração constitutiva, funcionando automaticamente a partir do momento em que ocorrer os factos determinantes da sua verificação (como resulta da conjugação entre os arts. 70º, nº1 e 71º, nº1 do CPA);segunda, por virtude do impedimento, o titular do órgão ou agente fica em princípio impedido de praticar qualquer ato no âmbito ao procedimento em causa (art 69º, nº 1 do CPA); terceira, e em consequência das anteriores, os atos ou contratos em que tenham intervindo titulares de órgãos ou agentes impedidos são ilegais e anuláveis (art 76º, nº1 do CPA).
   Já as situações do art. 73º não envolvem uma proibição absoluta, mas apena relativa, de intervenção do titular de órgão ou agente no procedimento; trata-se, por isso, de situações de impedimento relativo. O carácter relativo do impedimento traduz-se em três aspectos: primeiro, não existe uma enumeração taxativa das situações que originam o impedimento, tendo a lei recorrido a uma cláusula geral/ exemplificativa; segundo, até à decisão da questão do impedimento o titular do órgão ou agente deve continuar a intervir no procedimento como se nada se passasse (art. 75º,nº 3, a contrario sensu); terceiro, a declaração do impedimento tem carácter constitutivo.
    Ainda no seguimento da opinião do professor Marcelo Rebelo de Sousa, a vantagem prática das garantias preventivas de imparcialidade, do ponto de vista da atuação administrativa, é a de dispensar os interessados da prova da verificação da concreta parcialidade de uma conduta da administração.

Bibliografia:

FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso De Direito Administrativo. Tomo I. 4º ed. Almedina, 2015.
REBELO DE SOUSA, Marcelo; SALGADO DE MATOS, André. Direito Administrativo Geral- Tomo I- Introdução e Princípios Fundamentais. 3ªed. Dom Quixote, 2008.
Constituição da República Portuguesa e Legislação Complementar. AAFDL, 2015.

Código do Procedimento Administrativo. Porto Editora, 2016

Madalena Saramago, nº28241


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