Segundo o professor Freitas do
Amaral, a origem desta noção de imparcialidade vem do Direito Processual e da prática
dos Tribunais. Começou por se exigir a imparcialidade do juiz (que tinha que
ter uma posição super partes, não tomando
partido de nenhuma dos lados em contenda). Este princípio (art.9º do Código do Procedimento Administrativo- doravante CPA e art.
266º, nº 2 da Constituição da Republica Portuguesa [CRP] ) foi, segundo o professor Marcelo Rebelo de Sousa, durante
muito tempo entendido apenas como uma imposição de tratamento isento dos
particulares pela administração, no sentido de que esta não os poderia
favorecer ou desfavorecer por razoes ligadas aos titulares dos órgãos ou dos
agentes administrativos que estão em concreto na posição de decidir e atuar. Modernamente,
a imparcialidade deve ser entendida mais amplamente como tomada em consideração,
por parte da administração, dos interesses públicos e privados relevantes para
cada caso concreto.
Este princípio tem uma dimensão negativa
e uma dimensão positiva, na opinião do professor Freitas do Amaral. A dimensão negativa proíbe a administração
de, a propósito de um caso concreto, tomar em consideração e ponderar
interesses públicos ou privados que, à luz do fim legal a prosseguir, sejam irrelevantes
para a decisão. A dimensão positiva impõem
que, previamente à decisão de um caso concreto, a administração tome em consideração
e pondere todos os interesses públicos e privados que, à luz do fim legal e prosseguir,
sejam relevantes para a decisão. Da combinação das duas dimensões resulta
portanto de que a Administração Pública “deve
tratar de forma imparcial aqueles que com ela entrem em relação,
designadamente, considerando com objectividade todos e apenas os interesses
relevantes no contexto decisório e adotando as soluções organizatórias e procedimentais
indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção”
(art 9º do CPA).
A ordem jurídica assegura mecanismos
tedentes a assegurar que os titulares de órgãos e agentes administrativos não influenciarão
as decisões tomadas em procedimentos nos quais seria especialmente de recear
que se comportassem de modo imparcial. Estes mecanismos são as garantias
preventivas de imparcialidade. As garantias de imparcialidade implicam o
impedimento dos titulares de órgãos e agentes quanto à participação em
determinados procedimentos administrativos (o art.69º do CPA refere-se a situações
de grande proximidade entre o titular de órgãos ou agente e os interesses
privados em jogo no procedimento; já o art. 73º do mesmo código, numa escala
menor de gravidade, diz respeito a situações que, apesar de poderem suscitar
duvidas acerca da isenção do concreto titular de órgão ou agente administrativo,
a sua proximidade em relação aos interesses privados em jogo no procedimento é menor)
e na formulação das respectivas decisões. Em razão da diferente intensidade do perigo
de violação do princípio da imparcialidade em cada um dos grupos de situações é
também parcialmente diferente o regime jurídico dos impedimentos a que dão
origem. Assim, as situações do art. 69º do CPA envolvem o impedimento absoluto
do titular de órgão ou agente administrativo. O carácter absoluto do impedimento
significa desde logo, três coisas: primeira, o impedimento não carece de
qualquer declaração constitutiva, funcionando automaticamente a partir do
momento em que ocorrer os factos determinantes da sua verificação (como resulta
da conjugação entre os arts. 70º, nº1 e 71º, nº1 do CPA);segunda, por virtude
do impedimento, o titular do órgão ou agente fica em princípio impedido de
praticar qualquer ato no âmbito ao procedimento em causa (art 69º, nº 1 do
CPA); terceira, e em consequência das anteriores, os atos ou contratos em que
tenham intervindo titulares de órgãos ou agentes impedidos são ilegais e anuláveis
(art 76º, nº1 do CPA).
Já as situações do art. 73º não envolvem uma proibição absoluta, mas
apena relativa, de intervenção do titular de órgão ou agente no procedimento;
trata-se, por isso, de situações de impedimento relativo. O carácter relativo
do impedimento traduz-se em três aspectos: primeiro, não existe uma enumeração
taxativa das situações que originam o impedimento, tendo a lei recorrido a uma cláusula
geral/ exemplificativa; segundo, até à decisão da questão do impedimento o
titular do órgão ou agente deve continuar a intervir no procedimento como se
nada se passasse (art. 75º,nº 3, a
contrario sensu); terceiro, a declaração do impedimento tem carácter
constitutivo.
Ainda no seguimento da opinião do professor
Marcelo Rebelo de Sousa, a vantagem prática das garantias preventivas de
imparcialidade, do ponto de vista da atuação administrativa, é a de dispensar
os interessados da prova da verificação da concreta parcialidade de uma conduta
da administração.
Bibliografia:
FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso
De Direito Administrativo. Tomo I. 4º ed. Almedina, 2015.
REBELO DE SOUSA, Marcelo; SALGADO
DE MATOS, André. Direito Administrativo Geral- Tomo I- Introdução e Princípios
Fundamentais. 3ªed. Dom Quixote, 2008.
Constituição da República
Portuguesa e Legislação Complementar. AAFDL, 2015.
Código do Procedimento
Administrativo. Porto Editora, 2016
Madalena Saramago, nº28241
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