O
Princípio da Legalidade exprime a subordinação jurídica da Administração
Pública. Isto decorre do artigo 266º nº2 CRP e artigo 3º CPA.O Principio da
Legalidade comporta dois sentidos diferentes, o primeiro é a preferência de lei e o segundo é a reserva de lei. O primeiro veda a
administração de contrariar o direito vigente e o segundo refere que a atuação
administrativa tem de ter fundamento numa norma jurídica. Dentro do âmbito da reserva de lei existem ainda duas
maneiras complementares: a precedência de
lei e a reserva de densificação
normativa.
Historicamente,
o Princípio da Legalidade era visto numa dimensão positiva como a administração
só pode fazer aquilo que é dito na lei. Numa dimensão negativa, a administração
pode fazer tudo aquilo que não é proibido na lei. O Princípio da Legalidade no
Estado Liberal apenas submetia à análise deste princípio, as situações de
administração agressiva. O Princípio da Legalidade no Estado Social vem pôr em
crise esse entendimento. Observam-se as seguintes alterações: reequacionamento
do âmbito dos parâmetros de juridicidade da atividade administrativa na
atualização do conceito de agressão, e enquadramento a dar às novas atuações
administrativas em matéria prestacional e infra-estrutural. Concluiu-se assim
que historicamente a administração agressiva (atuações intromissivas na esfera
jurídica dos particulares e restritiva de direitos e interesses seus) é que
estava submetida de uma maneira mais restrita ao Principio da Legalidade
(dimensão positiva). Enquanto, que a administração prestador e infra-estrutural
(concede vantagens e programa a prossecução futura do interesse público) estava
submetida ao Princípio da Legalidade de uma maneira menos restrita (dimensão
negativa).
Mais
tarde, este critério é ultrapassado, porque o mesmo era relativo e havia
situações em que se criava confusões, pois tanto se configurava um prejuízo
como um benefício para o particular. Chegou-se à conclusão que perante
situações de administração prestadora e infra-estrutural não pode só valer a
dimensão negativa da legalidade. Desse modo a maioria da doutrina, concluiu que
perante qualquer tipo de administração (agressiva ou prestacional ou infra-estrutural)
temos sempre de verificar o Princípio da Legalidade na sua dimensão
positiva. Uma doutrina minoritária (Professores Sérvulo Correia e Paulo
Otero) continua a partilhar da opinião que a dimensão positiva do Princípio da
Legalidade só se aplica perante situações de Administração Agressiva.
Tal
como referido anteriormente o Princípio da Legalidade comporta dois sentidos:
1. Preferências de Lei- são
proibidas as atuações administrativas que contrariem a lei. Em caso de conflito
entre lei e ato administrativo prevalece a lei. A lei engloba todo o bloco da
legalidade (lei ordinária, regulamento, etc). Perante um ato administrativo que
contraria o bloco da legalidade, o mesmo é inválido e ilegal. Este primeiro
sentido do Princípio da Legalidade tem como objetivo a erradicação de atos
ilegais da ordem jurídica e o suprimento de omissões ilegais.
2. Reserva de Lei-
a administração tem de fundamentar o seu agir numa norma jurídica. Importa
saber quais as matérias em que a atuação administrativa carece de prévia habilitação
legal.
2.1. Precedência Total de Lei- a
administração para agir tem sempre de ter como base uma norma habilitante que
lhe confira poderes.
2.2.Reserva de Densificação Normativa- a
norma habilitante que confere poderes para a atuação administrativa, tem de ter
uma determinada densidade (determinado grau de especificação e pormenorização
quer dos pressupostos, quer dos meios de atuação). È necessário densificar a
incidência, previsibilidade e legitimidade. Podemos encontrar dois tipos de
normais: Fechadas (vinculam a administração) e as Abertas (margem
de livre apreciação). A Margem de Livre Decisão é o espaço de liberdade
da atuação administrativa que é conferido por lei e limitado pelo bloco da
legalidade. A margem de livre decisão comporta, a discricionariedade e a margem
de livre apreciação. A discricionariedade
é a liberdade conferida por lei à administração para que esta escolha entre
várias alternativas de atuação administrativa, envolve sempre juízos de
prognose. A margem de livre apreciação
é a liberdade conferida pela lei à administração de apreciar os factos que
dizem respeito aos pressupostos da sua decisão, envolve a indeterminação
vocabular e a liberdade avaliativa. Os limites da Margem de Livre Decisão são as
Vinculações Legais e os limites imanentes aos Princípios da Atividade
Administrativa (prossecução de interesses públicos, proporcionalidade,
imparcialidade, respeito pelas posições jurídicas subjetivas dos particulares,
boa-fé, igualdade e justiça).
Em
seguida vamos fazer uma pequena análise a um acórdão do Tribunal Central
Administrativo Norte. Em análise ao acórdão de 28 de Setembro de 2016 com
número do processo 00121/04 proferido
pelo Tribunal
Central Administrativo Norte, importa ter em conta os seguintes factos.
A
autora M instaura uma ação contra a Universidade do Porto e o
Contra-interessado A no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, com recurso
ao meio de condenação à prática do ato de instauração de procedimento
disciplinar ao contra-interessado. O fundamento da Autora é que a escolha do
Presidente ICBAS em requisitar a mesma para o ensino da cadeira de Toxicologia,
onde a autora seria docente e a Professora Doutora L seria regente, seria um
insulto para a mesma. A autora partilha desta opinião pois a regência dessa
cadeira foi entregue a uma professora menos graduada que ela, o que
constituiria uma ofensa à sua honra. A autora, inconformada com a decisão do
TAF do Porto que julgou a sua ação improcedente, interpõe recurso jurisdicional
para o Tribunal Central Administrativo Norte. Usa como fundamentos para a
interposição de recurso que a sentença proferida violou o princípio da
legalidade, violou alguns artigos do Estatuto Disciplinar, contendo também
alguns vícios formais e por último viola o artigo 71ºnº2 CPTA.
Importa
agora ter em conta a seguinte matéria de Direito.
1. O
Poder
Disciplinar é um poder que se traduz na possibilidade de aplicar
sanções aos agentes e funcionários em consequência da violação de deveres que
sobre os mesmos caibam. Este poder serve para assegurar a coesão e a segurança
no serviço administrativo. O Poder Disciplinar desdobra-se em ação disciplinar (averiguação de fatos
que possam levar a situações de infração) e competência
para aplicar sanções.
No
caso requerido pela autora, estamos no âmbito de ação disciplinar (a universidade do porto deveria averiguar se
aquele presidente cometeu ou não um infração). Entende-se assim, que o fato de
a Universidade do Porto dever ou não dever instaurar um processo disciplinar
cabe no âmbito dos poderes
discricionários da administração inseridos no princípio da legalidade mais
concretamente dentro da Reserva de Lei do mesmo. Concluímos assim que embora a
administração tenha de reger a sua atividade segundo o princípio da legalidade,
por vezes as normas podem configurar-se como fechadas (vinculativas) ou abertas
(discricionárias). Neste caso, o Estatuto Disciplinar dos Funcionários e
Agentes da Administração Central, Regional e Local é uma norma discricionária com aspetos
vinculantes (não é uma norma arbitrária), pois a mesma refere que para
além da observância dos critérios da legalidade é necessário também proceder a
juízos de apreciação sobre a conveniência e oportunidade no seu exercício à luz
dos interesses do serviço. Isto quer dizer que é autoridade administrativa,
Universidade do Porto, é que tinha de analisar e ponderar se o Presidente
cometeu ou não uma infração, não estando a mesma subtraída ao cumprimento do
referido dever.
Concluo
assim, que estes atos que envolvem o exercício de poderes discricionários são
suscetíveis de impugnação judicial fundada quer em ilegalidade formais como
substantivas. Entende-se que podem assim,
os Tribunais Administrativos proceder à fiscalização contenciosa jurisdicional
deste tipo de atividades administrativas quando estão em causa graves vícios (desvio de poder e erros
grosseiro) ou graves violações de
deveres de fundamentação ou de participação e de princípios gerais.
Configurando-se estes graves vícios e
graves violações como os limites dos poderes discricionários.
No
nosso caso, parece-nos que o Tribunal Administrativo pode fiscalizar esta ação,
pois a autora alega que há violação do princípio da legalidade e do dever de
fundamentação. Ainda assim, não cabe razão à autora porque não resulta dos
Estatutos dos Funcionários que a administração tem sempre uma obrigatoriedade automática de proferir um despacho que
determine que tem de haver procedimento disciplinar (não há nenhuma
violação desse estatuto). Logo a Universidade do Porto pode agir de
maneira contrária, não instaurando o processo disciplinar, tal como fez.
2. Perante os factos alegados pela autora, os
mesmos não integram qualquer infração disciplinar (não há ilicitude). O dever
de a contratar como docente justifica-se pelas necessidades da vida social,
pelo que não há violação das normas de “cortesia” e “bons costumes”
consagradas nos usos e costumes. Não se conjetura, que o teor da
comunicação feita à autora pelo contra-interessado resulte em infração
dos deveres de correção e de respeito a que o mesmo estava obrigado. Ou
seja, não houve nenhuma falta de respeito há honra e consideração da autora,
nem houve nenhum insulto ou menorização face ao seu estatuto, pelo facto de a
mesma ser docente de uma professora que já foi sua assistente. Concluiu-se que
o Presidente do Conselho Cientifico ICBAS não cometeu nenhuma infração disciplinar.
Em
conclusão, retira-se deste acórdão uma ideia de ampliação dos poderes de
fiscalização dos Tribunais Administrativos mesmo quando estão em causa
poderes discricionários. Refiro assim, que os Tribunais Administrativos podem
em todos os casos analisar e fiscalizar o agir administrativo. Os Tribunais
Administrativos não podem invadir o espaço de margem de livre decisão no
uso de poderes discricionários da administração no caso concreto, a menos
que administração viole os limites da margem de livre decisão.
Quer isto dizer que Administração
Pública pode agir segundo o Principio da Legalidade no exercício dos seus
poderes discricionários, mas tem de ter consciência que se violar os limites dos
poderes discricionários os Tribunais Administrativos podem invadir e fiscalizar
a sua atividade.
Bibliografia:
SOUSA,
MARCELO REBELO, Direito administrativo Geral, Tomo I
DGSI
Aluna:
Margarida Gil Silva nº 24421
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