quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Principio da Imparcialidade na Administração Pública


No desempenhar das suas funções a Administração tem de respeitar determinados princípios que irão reger a sua conduta, de modo a garantir a segurança e defesa dos cidadãos, contra possíveis abusos ou desvios das funções legais do próprio Estado.
Um dos princípios mais preponderantes neste sentido será o Principio da Imparcialidade(Imparcialidade: “Equidade; qualidade da pessoa que julga com neutralidade e justiça; característica de quem não toma partido numa situação.”)
Dispõe sobre o Princípio da Imparcialidade o Artigo 9.º do Código do Procedimento Administrativo que “a Administração Pública deve tratar de forma imparcial aqueles que com ela entrem em relação, designadamente, considerando com objectividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto decisório e adoptando as soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção”.
Para além do artigo 9º CPA, também versam sobre este princípio os artigos 266º, nº 2 da Constituição da Republica Portuguesa (CRP)[1] e 6º do Código Procedimento Administrativo (CPA)[2]
Para o Professor Freitas do Amaral o princípio da imparcialidade impõe que os órgãos e agentes administrativos actuem de forma isenta e equidistante relativamente aos interesses em jogo. Este princípio vincula os órgãos da Administração Pública, em especial nas suas relações com os particulares, a agirem com isenção, rectidão, objectividade, neutralidade e equidistância perante os interesses em presença.
Contendo um carácter positivo e negativo, o princípio da imparcialidade impõe à administração tem o dever de ponderar todos os interesses públicos secundários e os interesses privados equacionáveis para o efeito de certa decisão antes da sua adopção (vertente positiva). Para além do exposto, vale também referir a proibição imputada aos titulares de órgãos ou agentes da administração de intervir em procedimentos administrativos ou em acto ou contracto de direito público ou provado da Administração Pública, nos casos em que tenham um interesse especial "externo" ao caso concreto, que pudesse por em causa a sua decisão ou conduta (vertente negativa).
Sobre esta matéria dispõem os artigos 44º a 51º CPA, referente às garantias da imparcialidade
As normas do artigo 44º do CPA destinam-se a assegurar a transparência e a imparcialidade da actividade administrativa,
Relacionado com o princípio da imparcialidade está o princípio da transparência, constituindo o primeiro um corolário do segundo. O princípio da Transparência funciona então como garantia preventiva, exigindo que a Administração projecte para o exterior uma imagem translucida, criando sentimento de confiança nos cidadãos. Tal como o Principio da Imparcialidade, o princípio da transparência também se projecta em dois planos. Por um lado, sob a vertente funcional, impondo uma actuação administrativa sem opacidade, impenetrabilidade ou segredo para além do legalmente consentido; e por outro, no sentido organizatório-procedimental, exigindo que as soluções adoptadas pelo legislador ordinário e pela Administração, permitam que a actuação seja visível e percepcionada por todos.
O princípio da transparência tem então uma finalidade e fundamento garantístico (visa assegurar que a actuação da Administração não ocorre em termos imprevisíveis para os particulares e que estes a possam controlar) e democrático.
Podemos assim concluir que o Principio da Imparcialidade, muito relacionado com o Principio da Transparência, é fulcral no nosso Ordenamento Jurídico, visto ser a partir deste que os a segurança jurídica dos cidadãos seja preservado, proibindo à Administração Publica decidir as questões dos particulares com base em interesses próprios, tendo obrigatoriamente de adoptar uma conduta imparcial.

Bibliografia:
FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso De Direito Administrativo. Tomo I. 4º ed. Almedina, 2015.
CAUPERS, João. Introdução ao Direito Administrativo. 9ªed. Âncora
PEREIRA DA SILVA,Vasco. Em busca do Ato Administrativo Perdido.



[1] Artigo 266º/2 CRP: Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé”;
[2] Artigo 6º CPA: No exercício da sua actividade, a Administração Pública deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação.

Ana Margarida Antunes
24330

Que(m) é o órgão?

Como é comum dizer-se, a pessoa coletiva, seja de Direito Público ou Privado, não tem, naturalmente (como a pessoa física), vontade ou agir próprio, estando antes dependente dos seus órgãos para construir essa vontade e agir de acordo com a mesma. Questão diferente e quanto à qual não houve, durante muito tempo, resposta unânime, é a de saber o que é um órgão.
O Professor Marcello Caetano, numa nota de rodapé do seu manual de Direito Administrativo, resumia o debate doutrinal de então (deixando transparecer, claramente, a sua posição) do seguinte modo: “A grande oposição é entre os que consideram o órgão um centro objetivo de poderes, uma instituição, e os que o confundem com os respectivos titulares.”. Do outro lado da barricada encontravam-se, nomeadamente, os Professores Marques Guedes e Afonso Queiró.
Portanto, para o primeiro Professor, “Órgão é o elemento da pessoa colectiva que consiste num centro institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou pelo colégio de indivíduos que nele estiverem providos com o objectivo de exprimir a vontade juridicamente imputável a essa pessoa colectiva”, enquanto para os segundos o órgão é sempre, em última análise, a pessoa física, constituindo os respetivos poderes funcionais a sua competência.
Vejamos alguns argumentos de ambas as partes:
Em abono da tese institucionalista poder-se-ia dizer que, embora os indivíduos titulares do órgão possam mudar frequentemente, este permanece sempre o mesmo; “Assim, se o órgão se funde na pessoa colectiva como elemento essencial da sua constituição, já o mesmo não acontece com as pessoas singulares que são suportes dos orgãos”. A situação pode, contudo, ser vista noutra perspetiva: “Nos países latinos sobretudo, onde as reformas orgânicas amiudadas são de regra, acontece frequentíssimas vezes o contrário: é o serventuário que sobrevive às configurações sucessivas do cargo ou lugar, que o acompanha nas suas caprichosas deslocações de hierarquia para hierarquia funcional, ou que, extinto ele, acaba por ser transferido para quadro diverso”.
Voltando à primeira tese, note-se que o indivíduo apenas faz uso dos ditos poderes funcionais quando age em nome do órgão e em funções do mesmo; de resto, mantém a sua personalidade e poderá ter também relações com a pessoa coletiva, que o emprega, em que surge como indivíduo, não como órgão. Devolvendo a palavra aos defensores da segunda tese, estes fazem o Professor Marcello Caetano cair em contradição na sua definição de ato administrativo. Dizia este Professor: “acto administrativo é a conduta voluntária de um órgão da Administração”, podendo essa conduta constituir uma ação ou omissão. De facto, para agir, para adotar uma conduta, não basta um centro institucionalizado de poderes funcionais (seria mesmo preciso uma pessoa física).
O tempo veio a fazer prevalecer a tese institucionalista do Professor Marcello Caetano. O CPA define, no seu artigo 20º número 1, órgãos como “centros institucionalizados titulares de poderes e deveres para efeitos da prática de atos jurídicos imputáveis à pessoa coletiva”.
O Professor Freitas do Amaral vem recuperar as duas teorias, reconhecendo verdade em ambas, desde que devidamente circunscritas. A teoria institucionalista deveria valer quando estudamos o Direito Administrativo do ponto de vista da organização administrativa; já a teoria individualista (ou pessoalista, talvez) valeria numa perspetiva da atividade administrativa.
Parece-nos, contudo, que mesmo olhando à Organização, a recondução do órgão à pessoa física pode ser útil. Assim, a propósito dos governadores civis, o Professor Freitas do Amaral refere que, em 2011, estes foram exonerados, sem que se nomeassem substitutos e ficando os lugares vagos. A extinção deste órgão seria impossível, dado o artigo 291º número 3 da CRP, mas este Professor entende que a não nomeação dos governadores civis resulta igualmente numa inconstitucionalidade, pois “o Governo tem a obrigação constitucional de nomear os governadores civis e de não lhes sonegar, pelo menos, as competências que a Constituição expressamente lhes atribui”. A tese dos Professores Afonso Queiró e Marques Guedes, na nossa opinião, poderá reforçar esse argumento: um órgão não é simplesmente um feixe de poderes que podem ser repartidos por outros órgãos e serviços do Estado, antes devendo ser reconduzido a uma pessoa física que, neste caso, deveria ter sido nomeada e devia ser diferente da pessoa do Ministro da Administração Interna.

Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do – Curso de Direito Administrativo I, 4.ª ed., 2015;

CAETANO, Marcello – Manual de Direito Administrativo I, 9.ª ed., 1970;

GUEDES, Armando Marques – Direito Administrativo, 1956.


Francisco Ferreira, nº28134

Os "novos" serviços personalizados do Estado

Serviços personalizados do Estado assim era a expressão utilizada tanto pela doutrina como pela jurisprudência para definir aquilo a que Marcello Caetano na oitava edição do seu Manual de Direito Administrativo designou por Institutos Públicos. Geograficamente a denominação para  institutos públicos difere de Estado para Estado.  No país referencial do sistema romano-germânico (França) são designados de établissments publics que significa estabelecimentos públicos; no país que serve de leme ao sistema anglo-saxônico, a Inglaterra,  a doutrina diverge sendo que alguns autores denominam de public corporations (corporações públicas) e outros de public bodies ou seja, organismos públicos. Em Itália os autores não conseguiram encontrar unanimidade e alguns chamam de "fazendas públicas", enquanto que outros de "organismos para-estaduais". A doutrina nacional ao aprofundar e estudar o conceito notou que a denominação não seria a mais correta. Os serviços personalizados do Estado são uma espécie de institutos públicos, concluindo-se que todos os serviços personalizados do Estado são institutos públicos, mas nem todos os institutos públicos são serviços personalizados do Estado. 
Durante anos que estes representantes da Administração indireta do Estado não tiveram uma lei própria resultando isto na aprovação de numerosa legislação avulsa e na consulta da mesma. Se cruzarmos a fronteira e tomarmos o exemplo de  Espanha a situação era diferente. Desde 1958 que a  Ley 6/1997 de 14 de abril, de Organización y Funcionamento de la Administración General del Estado regulava os institutos públicos. Em Portugal, a lei apenas surgiu em 2004,  Lei 3/2004 de 15 de janeiro ou mais conhecida como Lei Quadro dos Institutos Públicos (LQIP). O nome atribuído gerou inquietação doutrinária pelo facto de a mesma se denominar de "Lei Quadro", uma vez que apenas e só a Constituição da República Portuguesa tendo por base o artigo 112/3 pode indicar quais as leis de valor reforçado. A explicação encontrada revela que a expressão "Lei Quadro" não pretende ir em contra da CRP, mas apenas indicar que a área de atuação da mesma é bastante alargado prendendo-se com matérias jurídico-materiais e não jurídico-formais. Deve-se fazer a ressalva de que nem todos os institutos são de origem estadual, podendo alguns pertencerem à administração indireta das regiões autónomas ou municipais, contudo sendo exemplos escassos em Portugal. E que os mesmos podem englobar institutos menores como o caso dos subsistemas públicos, exemplo disso os "serviços sociais universitários". 
O professor Diogo Freitas do Amaral define institutos públicos como: uma pessoa coletiva pública, de tipo institucional, criada para assegurar o desempenho de determinadas funções administrativas de caratér não empresarial, pertencentes ao Estado ou a outra pessoa coletiva pública. O professor começa por indicar que são uma pessoa coletiva pública de acordo com o artigo 3/4 e o artigo 4/1 da LQIP e que de acordo com a mesma têm sempre personalidade jurídica, artigo 3/1 LQIP. Na base existe uma instituição e não uma associação o que os distingue das associações públicas. O artigo 8 da LQIP indica que são criados para funções administrativas determinadas, portanto existe uma dupla vertente: uma das funções é assegurar que sejam cumpridas as tarefas públicas de caractér administrativo, logo não se englobam as de tipo privado; por outro lado, fala-se da determinabilidade das suas tarefas, não podendo abranger uma panóplia enorme de funções sendo restringidas como indica do artigo 8/3 da LQIP. Assim, o professor refere que a sua vocação é especial e que suporta fins singulares ao contrário do Estado e das autarquias locais que são de fins múltiplos e com uma vocação geral. As  atividades pautam-se por ser  de caratér não empresarial de acordo com o artigo 3/3 da LQIP. Por último, as suas funções têm raízes pertencentes ao Estado ou a outra pessoa coletiva pública, como consta do artigo 2/1 da LQIP. 
Os institutos públicos comportam uma tripartição: os serviços personalizados, as fundações públicas e os estabelecimentos púbicos. A definição de serviço personalizado encontra-se no artigo 3, nºs 1 e 2 da LQIP. Funcionam numa espécie de "aparência", já que a ilusão criada faz querer que têm personalidade e autonomia própria, contudo são apenas departamentos que apenas cumprem as suas funções. Uma das espécies mais importantes são os mecanismos de coordenação económica, designados como serviços personalizados do Estado que se destinam a coordenar e regular o exercício de determinadas atividades económicas, que pela sua importância merecem uma intervenção mais vigorosa do Estado, por exemplo: Instituto da Vinha e do Vinho, do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto. Pode-se pensar que estes organismos apenas realizam afazeres simples, como fazer ou conceder uma licença, contudo devido ao ramo para que são direccionados podem chegar a elaborar tarefas complexas como comprar ou vender produtos. O facto de estarem sujeitos a este tipo de procedimentos faz com tenham uma fiscalização por parte do Estado bastante acentuada, mas pelo facto de realizarem estas operações complexas leva que lhe seja atribuída uma grande dose de flexibilidade, razão que explica a tal "aparência" de autonomia de que muitos falam.
As fundações públicas encontram-se fixadas no artigo 49/1 da Lei 150/2015 de 10 de setembro, que rege as fundações públicas e denominada de  Lei Quadro das Fundações (LQF) e no artigo 3 nºs 1 e 2 da LQIP. As fundações públicas são os únicos institutos que se encontram reguladas tanto no diploma geral como num diploma especial. As fundações podem adotar duas grandes vias: ou ser de origem privada e estando reguladas no CC ou que a sua finalidade seja pública, como consta do artigo 50 da LQF e encontrarem-se reguladas tanto na LQIP como na LQF. O património das mesmas é destinado a fins públicos, mas a lei indica que para se ser considerada como "fundação pública" deve uma "parte considerável" das suas receitas serem dirigidas a "finalidades de interesse social ou " interesses públicos de natureza social, cultural, artística ou outra semelhante" - artigo 50/2 LQF. Um dos exemplos mais conhecidos de fundações públicas é o Fundo de Abastecimento ou a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior.
Por último, encontram-se os estabelecimentos públicos que podem ser considerados de caratér cultural ou social, organizados como serviços abertos ao público, e destinados a efectuar prestações individuais à generalidade dos cidadãos que delas careçam, definição do professor Freitas do Amaral.  O exemplo paradigmático são as universidades públicas. As universidades são de caratér cultural e estão organizadas em serviços abertos ao público sendo que a sua principal finalidade é o ensinamento, logo não podem ser consideradas fundações públicas de direito privado, fundações públicas ou empresas públicas. Os poucos hospitais que não foram convertidos como entidades públicas empresariais também se podem considerar como estabelecimentos públicos. Os mesmos oferecem um serviço aberto ao público e fornecem um serviço médico e hospitalar aos que necessitam. A Misericórdia de Lisboa também se inseria neste grupo, mas desde 1991 é considerada como uma pessoa coletiva de utilidade pública administrativa.
Concluindo, os institutos públicos são organismos de base institucional que se encontram na Administração estadual indireta e encontram-se regulados pela LQIP de 3/2004 de 15 de janeiro. Apresentam uma tripartição em: serviços personalizados, fundações públicas e estabelecimentos públicos. Os primeiros pertencem aos serviços centrais de um Ministério de acordo com as funções e as características do mesmo; as segundas, financiam-se pela gestão do seu património e através dele conseguem preceder os seus fins e os últimos não têm nenhuma das características dos anteriores, pautam-se por apresentarem um serviço aberto ao público e destinado a prestar serviços culturais e sociais.


Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo; 2015, 4ª edição, Almedina, Volume I, §3º - A Administração estadual indireta; II- Os institutos públicos, páginas 309-325.

Webgrafia:
http://www.fgcam.pt/pt-PT/Legislacao/Lists/FolderDeListaComLinks/Attachments/17/Lei%20Quadro%20Consolidada.pdf

http://www.serralves.pt/documentos/Lei%20Quadro/LeiQuadro_Fundacoes_Lei150_2015.pdf


Catarina Nogueira Toscano, nº 28254. 


A execução prévia em Portugal, privilégio?

Os sistemas administrativos francês e português têm pertença à mesma família romano-germânica, existindo entre ambos várias semelhanças. O sistema administrativo francês surgiu na necessidade de uma resposta ao problema da ausência de jurisdição especial com competência para apreciar os litígios que pudessem surgir no decorrer do exercício da função administrativa. O sistema português acabou por dar seguimento a este sistema, baseando-se no mesmo sistema. 
Daí resultam características e semelhanças comuns, como já referido, tal como a notoriedade e importância do poder executivo quando comparado com o poder judicial, e a particularidade da existência, originalmente, de uma submissão por parte da administração pública a um direito próprio que regulava a sua actividade, baseado e inspirado nos ideais da protecção dos direitos individuais, tendo estes como principal finalidade.
Resultou ainda por "herança" o privilégio da execução prévia, um dos principais traços característicos que o sistema português consagrou e prosseguiu, quanto ao sistema de administração executiva.
A Reforma de 2002/04 trouxe uma aproximação do nosso sistema ao sistema britânico, da família da common law, através do reforço dos poderes de controlo que os tribunais passaram a ter em relação à Administração Pública. 

Por outro lado, o Legislador do novo Código de Procedimento Administrativo (CPA - 2015) contribuiu e consagrou legalmente, um afastamento face ao sistema francês, ao erradicar do direito administrativo português o privilégio da execução prévia, e acabando assim por reforçar, segundo alguns autores da doutrina, a aproximação ao sistema de Administração Judiciária. 


O Código de Procedimento Administrativo (CPA) de 1991 consagrava, quanto à legalidade de execução, que as decisões da Administração Pública eram executadas a título próprio, sem recurso aos tribunais, através de meios coercivos caso existisse essa necessidade para a prossecução dos seus fins. Dispunha-se no artigo 149º, nº2 “O cumprimento das obrigações e o respeito pelas limitações que derivam de um acto administrativo podem ser impostos coercivamente pela Administração sem recurso prévio aos tribunais, desde que a imposição seja feita pelas formas e nos termos previstos no presente código ou admitidos por lei”. Ainda o CPA de 1991 consagrava no artigo 151º uma excepção ao privilégio de que a Administração dispunha, tentando evitar situações de abuso de direito e deste modo evitando e restringindo, através de impossibilidade a actuação da mesma quando se verificasse, através desta actuação a limitação de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares.

O novo Código (CPA - 2015) trouxe consigo alterações importantes, tanto a nível de institutos (o acto administrativo e o regulamento), como em relação à actuação da Administração Pública, que passou a estar sujeita a um dever de boa gestão e passou a ser responsabilizada pelas suas práticas. Houve uma mudança de paradigma de um dos traços mais característicos do nosso sistema, o privilégio da execução prévia.

No actual CPA, a norma relativa à legalidade da execução foi alterada, resultando que o privilégio da autotutela executiva, de que dispunha a Administração Pública, já não se encontra consagrado na mesma. O artigo 176º prevê os casos excepção, em que é possível a execução coerciva dos actos administrativos, casos relativos a situações de urgente necessidade pública ou casos previstos na lei. Todos os outros actos da administração pública que carecem de execução coerciva apenas podem ser executados nesses termos através de decisão judicial, artigo 183º do novo CPA.

Tudo isto corresponderia à ideia inicial do Legislador; contudo o Decreto-Lei que aprovou o novo CPA dispõe, no artigo 8.º n.º 2, que o regime estabelecido no artigo 176º do novo código de Procedimento Administrativo, só se aplicará quando entrar em vigor um diploma autónomo que venha determinar especificamente os casos em que o acto administrativo é executório. Este diploma deveria ter sido aprovado no prazo de 60 dias, a contar da data da entrada em vigor do novo CPA mas tal ainda não ocorreu. Assim sendo, até à aprovação do diploma, mantém-se em vigor a regra do privilégio da execução prévia, estabelecida no artigo 149.º n.º 2 do CPA de 1991.O Professor Freitas do Amaral considera este um caso raro, na medida em que a mais significativa alteração ao CPA acabou por se ver adiada por um tempo indeterminado.
Para alguns autores a alteração no regime da execução dos actos administrativos trará dificuldades de aplicação prática, comportando o aumento da pendência judicial e consequentemente a paralisação da Administração, uma vez que os tribunais serão chamados mais vezes a intervir.

A meu ver, parece-me que o Legislador criou o artigo 176º do CPA de 2015, com o intuito de estabelecer legislação específica para a execução coerciva dos actos administrativos. No entanto, ciente das dificuldades que o mesmo acabaria por trazer, adiou a sua entrada em vigor por prazo indeterminado, até a norma em causa possa ser exequível, através da determinação específica dos casos em que o acto administrativo seja executável.

Ricardo Silva; Nº aluno - 28531

A Administração Electrónica: desmaterialização do procedimento com reservas.

O Novo Código do Procedimento Administrativo consagra um registo muito inquietante face às matérias electrónicas. Isto pois 15 anos passados do ano 2000 a opção do legislador, de dar trato às matérias cada vez mais berrantes por regulação e actualização, é de delicadeza. Nota-se lendo o CPA que existe um certo receio por parte do legislador de temer a segregação dos info-excluídos, e de não informatizar toda a actividade procedimental da Administração, uma vez que a informatização da actividade procedimental é tida muito pouco em conta face à actualidade - temos como exemplos do progresso de informatização os artigos 61º e 62º do CPA.

Protestamos contra esta lógica do legislador. Estando nós num país com um sector público de tamanho imenso e com uma dívida pública insustentável, não se justifica a vagareza informatização do procedimento administrativo. Se o legislador tiver receio de segregação dos analfabetos-informáticos que regule tais matérias como normas especiais, mas criando um regime geral em que procura realmente ter respeito pelos princípios gerais do procedimento administrativo a título do art. 5º do CPA. Como se pode entender como boa administração aquela que ainda opera num registo esgotado, ineficiente, custoso e lento? O próprio CPA  mostra-se pouco convincente aquando inclui este tipo de princípios tão utópicos e fundados em Sollen, pois quando se procura aplicar Sollen e torná-lo em facto jurídico operacional o mesmo CPA mostra várias reservas à aplicação destes princípios.

É o próprio princípio da boa administração que impõe esta necessidade de uma emergência mais assertiva de uma administração electrónica que funcione. Nós sabemos que ela existe, mas que pouco admiração tem visto as notícias mediáticas dos erros informáticos que nela existem. E tão pouco precisamos de recorrer às notícias face aos erros informáticos decorrentes da devoluções do IRS. Olhemos para o progresso do célebre sistema fénix. Este exemplo próximo que todos nós sentimos os efeitos das suas falhas e problemas elucida-nos pela falta de regulamentação da administração electrónica. É justificável o agravamento da burocracia pelo procedimento administrativo informatizado ser altamente incompetente? A que título? Como é que em 2016 temos neste portal informático as mesmas opções que tínhamos no anterior mudando a variante em que agora poucos sabem mexer neste? Tenho as minhas reservas face ao facto de se justificar uma administração electrónica que cresça num ambiente anárquico sem linhas gerais face à sua concretização.


Pedro Caeiro

A Administração Periférica- Conceito e Espécies



   Como refere o professor Dr. Freitas do Amaral, no vocabulário administrativo refere-se "periferia" para designar as áreas territoriais, situadas fora da capital do País, áreas essas onde a administração actua. Assim sendo na periferia estão e actuam tanto os serviços locais (regionais, distritais, concelhios ou de freguesia), quer os órgãos e serviços sedeados no estrangeiro (embaixadas, consulados, serviços de turismo, etc.)
   É de notar que a administração periférica, mesmo quando seja de âmbito local não pode ser confundida com a administração local autárquica. Esta ultima é constituída por autarquias locais, ao passo que a primeira é composta por órgãos e serviços do estado, ou de outras pessoas colectivas publicas não territoriais.
 
    O artigo 11º nº4 al.b) da Lei da Administração Directa do Estado (LAD)- lei nº4/2004, de 15 de Janeiro apresenta uma definição para serviços periféricos. O professor Dr. Freitas do Amaral define a administração periférica em termos muito próximos a este disposto legal, ela é o conjunto de órgãos e serviços de pessoas colectivas públicas que dispõem de competência limitada a uma área territorial restrita, e funcionam sob a direcção dos correspondentes órgãos centrais.
    Deste modo este sub-grupo de administração pode ser caracterizado pelos seguintes aspectos fundamentais:
   - Segundo o disposto no art 11º nº5 da LAD: é constituída por um conjunto de órgãos e serviços, quer locais quer externos;
   - Esses órgãos e serviços pertencem ao Estado, ou a pessoas colectivas publicas de tipo institucional   ou associativo;
   - A competência de tais órgãos é limitada em função do território, nã abrange nunca a totalidade do território nacional;
   - E ainda, segundo o professor Dr. João Caupers, os órgãos da administração periférica funcionam sempre na dependência hierárquica dos órgãos centrais da pessoa colectiva publica a que pertencem.

Através dos seus aspectos fundamentais pode-se entender-se  as seguintes espécies:
 a) Órgãos e serviços locais do Estado;
 b) Órgãos e serviços locais de institutos públicos e de associações publicas;
 c) Órgãos e serviços externos do Estado;
 d) Órgãos e serviços externos de institutos públicos e associações publicas.

  Todos estes tipos de serviços estão interligados entre si mas actuando em dois grandes blocos pois os referidos na alínea a) chamam-se administração local do estado; ao conjunto formado pelas alíneas a) e b) designa-se de administração periférica interna; já ao conjunto das alíneas c) e d) dá-se a designação de administração periférica externa; e por ultimo, ao conjunto das alíneas a) e c) atribui-se a denominação de administração periférica do Estado.

Como refere o professor Dr. Vasco Pereira da Silva,quando falamos em administração periférica temos de considerar quer estas entidades de âmbito local, quer as entidades de âmbito externo, quer do Estado, quer de institutos públicos e outras instituições que integram a administração indireta, e, portanto, há aqui uma lógica que introduz a necessidade de coordenação destes diferentes institutos

Bibliografia:
FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso De Direito Administrativo. Tomo I. 4º ed. Almedina, 2015.
CAUPERS, João. Introdução ao Direito Administrativo. 9ªed. Âncora
PEREIRA DA SILVA,Vasco. Em busca do Ato Administrativo Perdido.

Madalena Saramago Nº28241

A Administração Periférica

Existe uma divergência entre autores no que toca à Administração periférica. Uma concessão mais popular, adotada por João Caupers, divide a administração periférica em dois tipos. Primeiro, a administração central, que consiste na administração principal do Estado e que atua sobre todo o território nacional e, em segundo lugar, a administração local que atua só numa porção especifica do território. Este segundo tipo de administração pode também ser dividida em administração comum-  que desempenha missões de representação do governo e de segurança de pessoas e bens-
e em administração especializada- que desempenha missões especializadas correspondentes a serviços especializados- sendo que ambas são desempenhadas pelos mesmos órgãos. Esta conceção é apoiada pela maioria dos autores, mas hoje em dia torna-se um pouco desatualizada.

Surge, então, a conceção do Prof. Freitas do Amaral, que separa a administração central da periférica, dividindo esta segunda da seguinte forma:
v Administração Periférica:
1.     Local
a.     Órgãos e serviços locais do Estado
b.     Órgãos e serviços locais de institutos públicos (administração indireta)
2.     Externa
a.     Órgãos e serviços externos do Estado
b.     Órgãos e serviços locais de institutos públicos (administração indireta)
É importante definir, em primeiro lugar, o que são os órgãos e os serviços do Estado. Os órgãos são os centros de decisão divididos pelo território nacional e internacional autorizados por lei a resolver questões administrativas por parte do Estado, questões que também podem ser desempenhadas por entidades da administração indireta. Por sua vez, os serviços do Estado estão encarregados de executar as decisões dos órgãos do Estado, também podendo ser executadas por entidades da administração indireta.

O Prof. Freitas do Amaral define a administração periférica como “o conjunto de órgãos e serviços de pessoas coletivas públicas que dispõem de competência limitada a uma área territorial restrita, e funcionam sob a direção dos órgãos centrais”. Esta definição esclarece que este tipo de administração pode ser do tipo local ou externo, como foi explicado na divisão supramencionada. Explica, também, que a administração periférica pertence a pessoas coletivas públicas, nomeadamente a órgãos ou serviços do Estado ou a órgãos e serviços da administração indireta. Neste tipo de administração são entidades que têm personalidade jurídica autónoma do Estado, mas que exercem funções da administração central, ou seja, têm uma relação umbilical à administração central. Aqui fala-se na dependência hierárquica para com os órgãos centrais, pois apesar da sua autonomia, a sua função é ajudar a desempenhar as funções da administração estadual, tendo esta o poder de coordenação das atividades entre os órgãos da administração periférica e também a capacidade de nomeação e demissão dos órgãos dirigentes. Estes ditos institutos públicos, e os outros órgãos da administração indireta, são criados para tornar mais efetiva e para prevenir o peso excessivo e burocratização da administração central. A definição salienta por último que a administração periférica está restrita a uma parte do território nacional, distinguindo-a mais uma vez da administração central.

Importa mencionar que, por norma, como é claro na definição do Professor, os serviços periféricos estão dependentes dos órgãos da pessoa coletiva a que pertencem, no entanto, existem algumas exceções a esta regra. Pode uma lei atribuir a direção de determinados serviços do Estado a órgãos de autarquias locais. Estes serviços não se transformam em serviços de natureza autárquica, apenas são dirigidos excepcionalmente por estas entidades, mantendo a sua natureza de serviços estaduais. As regiões autónomas são também uma exceção no sistema vigente em Portugal, pois é possível a transferência dos serviços periféricos do estado para a dependência dos órgãos do governo dos Açores e da Madeira, de acordo com a política da regionalização e da autonomia das regiões insulares. Estas estão referidas nos artigos 227º e ss. da CRP. Salienta-se na alínea o) do art 227/1º da CRP que pertence às regiões autónomas a função de gerir os serviços, os institutos e as empresas públicas que exercitem a sua atividade exclusiva ou predominantemente na região e em casos em que o interesse regional o justifique.

É fundamental, por último, comentar o funcionamento da administração periférica em Portugal. Irei destacar em particular a realidade da administração periférica local do Estado. Aqui surge um problema quanto à estrutura organizativa desta administração, pois não é clara. A CRP, com fundamento no Princípio da Regionalização, cria uma realidade que nunca pode vigorar no sistema português. De acordo com a Constituição, a administração local do Estado deverá funcionar baseada numa estrutura regionalizada, ou seja, terá de haver em escala nacional a divisão administrativa do território com estrutura regional, havendo também nessa região os órgãos estaduais habituais. Na realidade, este processo falhou e a norma funciona agora como travão à regionalização. Isto é, a norma exige que, para a criação de regiões administrativas, haja uma lei que crie todas as regiões de uma vez, com uma instituição para cada uma das regiões, submetida a referendo, tornando o processo quase impossível. A nossa administração local tem, portanto, vários Ministérios com estruturas autónomas, poucas delas tendo uma estrutura regional. Estes aspetos revelam uma deficiência na organização da estrutura administrativa local do Estado, deficiência esta que necessita de ser resolvida.

Bibliografia
Diogo Freitas do Amaral- "Curso de Direito Administrativo, vol 1"

João Caupers- "Introdução ao Direito Administrativo"


Luciana Ayres de Campos, nº 28108
Diz Freitas do Amaral, a propósito do Município: “(...) é inegável que é ao nível municipal que se joga e se pode testar a concepção do Estado, da Democracia e do Poder, vigente em dado momento numa sociedade (...).” Caberá então indagar da sua origem e dos motivos do seu surgimento no panorama português.
      No Medievalismo nacional, é já o concelho a primeira das instituições municipais, sendo relevante destacar os contornos polissémicos desta expressão. Se, por um lado, através dela se pretende designar determinada circunscrição territorial, por outro, invoca-se o collatio ou concilium, isto é, a assembleia dos homens-bons (vizinhos), que reunia periodicamente e que, dotada de vastas competências deliberativas nos assuntos concernentes aos interesses do concelho – tomado agora em sentido geográfico -,  se afirmou como cerne da organização administrativa municipal. De referir será que a classificação de “homem bom” obedece a determinados critérios, não se verificando, claro está, a existência de qualquer modo primitivo de eleição ou escolha por parte dos restantes habitantes do concelho. Ainda assim, representavam-no, estes, e aos seus interesses – públicos, diríamos, hoje.
         Nota-se que a divisão territorial administrativa do Norte se distingue da do Sul, abaixo do Douro. Enquanto que, no primeiro caso, eram os julgados os núcleos fundamentais daquela organização, é no segundo caso que mais se enraiza a organização municipal, dividindo-se o concelho em dois pólos distintos: a vila, urbana, e o alfoz, a periferia.

         Não  obstante as teorias desenvolvidas por reputados historiadores acerca da origem do município português, crê-se ter sido das necessidades de organização decorrentes da Reconquista que terá nascido a organização municipal. Como é sabido, a profunda desconcentração do poder régio e as dificuldades da sua imposição face aos grandes senhores feudais, a par da dispersão provocada pela intensa actividade militar, deixaram a organização das povoações para plano secundário. Face a este cenário, foram estas que, na necessidade de solucionar os problemas emergentes do seu quotidiano de forma rápida e eficiente, se auto-estruturaram, podendo neste sentido dizer-se que o município português configura uma nova forma de organização e não o último estágio evolutivo de outras que o tenham precedido. Dirá Marcello Caetano que o município não é, no entanto, alheio a influência românica, ainda que por via erudita. Pretende o Professor referir o facto de o Clero, classe letrada e conhecedora da cultura romana, influir na criação deste modo particular de administrar, assim se justificando as semelhanças entre as instituições romanas e as portuguesas. Importa ainda assim frisar que os municípios surgem espontaneamente, sendo reconhecidos quer pelos Reis quer pelos Senhores Feudais. A centralização do poder político vem naturalmente influir na sua organização, revestindo-se de particular relevância a Reforma Manuelina dos Forais. 

Filipa Almeida, 
nº. 28166